quinta-feira, 31 de maio de 2012





Photobucket nina sawinska





 "Havia um muro alto entre nossas casas. Difícil mandar recado para ela. Não havia e-mail. O pai era uma onça. A gente amarrava o bilhete numa pedra presa por um cordão E pinchava a pedra no quintal da casa dela. Se a namorada respondesse pela mesma pedra Era uma glória! Mas por vezes o bilhete enganchava nos galhos da goiabeira E então era agonia. No tempo da onça era assim."

  manoel de barros






ando doente. talvez o mundo seja esse lugar pequeno onde o rosto não cabe - penso que se me faltassem as mãos não poderia construir lugares maiores - não tenho onde pousar o corpo e os ossos que doem e o corpo que não parte e o que eu gostaria que partisse não vai. nem volta - por dentro o mundo adquire outros significados que podem ser do tamanho que eu quero. porque são meus. por fora pouco depende de mim e o país morre - quero fechar os olhos e acordar amanhã - que o futuro seja este sonho que tenho -




quarta-feira, 23 de maio de 2012









rebecca rijsdijk 






Que nos adiantam os pianos?
E os clarins marchando na manhã?
Espero o fogo, o fogo sobre nós.
Quem troca seu corpo por um pão?
Pedimos água e nos dão veneno.
  murilo mendes








 nascemos dos pássaros que as árvores abandonaram e ainda assim somos felizes - ontem lembrava-me dos tempos idos da infância e do tio zé descalço a mondar. mondar é um verbo perdido de significado. as minhas crianças não sabem dele - é preciso dizer ao mundo o que o tempo foi. a cara da gente dura de terra - é preciso dizer essas palavras que o tio zé já não diz por ter morrido - perdemos o infinitivo [o que vem do infinito] - sei hoje que pouco há de belo no mundo e que o mundo passa porque o tempo o leva. da vida nunca saberei nada - quando reparei já as árvores tinham partido e os pássaros corriam como loucos à procura de casa.




terça-feira, 1 de maio de 2012






Michael G Magin 







A cidade é a mesma e no entanto
há portas que não posso atravessar
sítios que me seria doloroso outra vez visitar
onde mais viva que antes tenho medo de encontrar-te
Morreste mais que todos os meus mortos
pois esses arrumei-os festejei-os
enquanto a ti preciso de matar-te
dentro do coração continuamente
pois prossegues de pé sobre este solo
onde um por um perigo os meus fantasmas
e tu és o maior de todos eles
não suporto que nada haja mudado
que nem sequer o mais elementar dos rituais
pelo menos marcasse em tua vida o antes e o depois
forma rudimentar de morte e afinal morte
que por não teres morrido muito mais tenhas morrido

ruy belo







 tenho pensado muito em ti laura. que os dias mais compridos te cheguem calmos. que serena vás pela vida - às vezes procuro nas árvores o conforto da tua companhia é quando ouço os pássaros - tenho saudade de quando me falavas sobre a morte e o mundo não te ouvia - só ruy belo entendia que em legítima defesa nenhum corpo pode permitir que decidam a sua própria morte - tu sabes - quis falar-te de nietzsche. de flaubert. de camus. de chopin. e de outras coisas mais banais como chá de ervas doces e mel - tenho pensado muito em ti laura - tu sabes - poucas vezes a vida me permitiu a esperança - eu estou bem. ando quieta. é o melhor a fazer. por fora o mundo cai. o país morre. por dentro o sonho cresce - continuo a ler. isto e aquilo. sempre muito - encontrei outro mito de sísifo. apesar de tudo prefiro o teu - nunca te disse mas foste tu que me mostraste o homem absurdo - seja como for. tenho pensado muito em ti laura.