sábado, 2 de outubro de 2010













não fiques triste amanhã falo-te de amor, do sorriso agora amarelo da minha avó, das mãos sempre gastas do meu avô. depois talvez te conte de como a vida me tramou. se tiveres tempo choro contigo só um bocadinho. o corpo precisa de água. deixa-me dizer-te antes de afogares que o tempo não chega. e num dia de água como o de hoje, morri. morri abraçada a uma nuvem baixa que me ficou presa nos cabelos. depressa fui para o céu amparada por dois pássaros de pescoços altos e esguios e longas asas. nunca mais ninguém me viu. dizem-me as nuvens que sentem saudades minhas agora que nunca mais me verão. dizem-me que às vezes também como tu andam tristes. eu fecho os olhos e choro para dentro, é assim que se faz no céu. muitas vezes lembro os rostos das pessoas que amei, da avó e do avô. muitas vezes também eu tenho saudades. mas são os pássaros, os que vêm em bandos, que me levam para as terras longe. conheço muitas árvores agora. um dia quando tiveres tempo e quiseres falo-te delas. são árvores bonitas, de tronco grosso e braços longos no ar. muitas vezes fico a vê-las anoitecer, principalmente nos dias pequenos. vejo os bichos recolherem aos troncos e a chuva a adormecer a madeira. lembrei-me agora dos bichos, talvez noutro dia te fale deles. se tiveres tempo e quiseres hei-de contar-te dos insectos ou das flores. há muitas flores a nascer à raiz das árvores, até no inverno. não fiques agora triste, amanhã falo-te destas coisas quando tivermos chorado um bocadinho. em dias de água o tempo não espera, nem perdoa. não esperes para te afogares. vai conhecer os pássaros, as árvores, os bichos e as nuvens. são futuros mortos como nós.










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